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Diabetes tipo 1: como surge a autoimunidade?

Capa do post com utensílios usados para fazer teste da taxa de glicose no sangue ao fundo e o título " Diabetes tipo 1: como surge a autoimunidade?" à frente.

A diabetes tipo 1 ocorre devido a uma reação autoimune que ainda não sabemos muito bem por que acontece. Entenda no post uma das hipóteses que tenta explicar o surgimento da doença.

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A diabetes ocorre devido a uma desregulação do nível de glicose no sangue, obrigando os doentes a fazerem uma dieta cuidadosa, de modo a evitar flutuações na taxa desse açúcar. A doença é normalmente detectada depois de episódios de frequência urinária elevada, ou de ingestão excessiva de água e alimentos.

Embora exista uma diversidade de tipos de diabetes, podemos destacar o tipo 1 e o tipo 2 como os mais frequentes na população. O tipo 2, também chamado não insulinodependente, está mais associado à obesidade e a fatores ambientais que geram predisposição ao surgimento da patologia. Já a diabetes tipo 1, ou insulinodepente, está relacionada a um defeito no sistema de defesas do organismo — o sistema imunológico.

Qual é a relação entre diabetes e o sistema imunológico?

O sistema imunológico é composto por várias células com diferentes especificidades para as proteínas de organismos invasores. Ele contém ainda medidas de segurança biológicas que eliminam quaisquer células imunológicas que sejam desenhadas erradamente para atacar as células do próprio corpo humano.

As doenças autoimunes, como a diabetes tipo 1, surgem quando há uma falha severa o suficiente desses mecanismos para causar uma patologia. Neste caso, quem sofre o ataque equivocado das células imunológicas são as células beta do pâncreas, responsáveis pela produção de insulina — o hormônio necessário para a passagem de glicose da corrente sanguínea para as células.

O que compõe um sistema imunológico eficiente?

Para uma defesa imunológica eficiente há um processo essencial que se relaciona igualmente com o surgimento de doenças como a diabetes tipo 1: o reconhecimento de componentes estranhos ao organismo (vírus, bactérias, entre outros).

Essa identificação ocorre com o auxílio de células com complexos proteicos conhecidos como ‘MHC’ (do inglês major histocompatibility complex), que possuem em sua superfície proteínas do elemento hostil e as apresentam para células como os linfócitos T e B. Estes, por sua vez, possuem receptores preparados para reconhecer proteínas de diferentes invasores.

Como surge a autoimunidade da diabetes tipo 1?

Para surgir a autoimunidade é necessário que as células “apresentadoras” contenham complexos ‘MHC’ que sejam eficientes na apresentação das proteínas. Outra condição é que os linfócitos têm de ter receptores preparados para reconhecer proteínas do corpo humano como invasivas!

Além disso, é necessária uma terceira condição para a instalação da autoimunidade na diabetes. Ela está correlacionada com a presença de fatores ambientais que quebrem os mecanismos de tolerância às proteínas do corpo humano. A hipótese favorita dos imunologistas atualmente passa pelo ‘mimetismo molecular’.

Como já mencionado, as células T e B têm receptores aptos a ‘reconhecer’ as proteínas dos microorganismos que invadem o nosso corpo. Devido à diversidade de possíveis invasores nocivos para o ser humano, existe também uma variedade destes receptores, sendo que cada um deles poderão estar aptos a reconhecer uma ampla gama de proteínas potencialmente nocivas.

A hipótese do mimetismo molecular determina que dentro dessa gama também podem estar proteínas do corpo humano. A partir do momento em que ocorre a invasão de um microorganismo, e a consequente ativação das células de defesa, há o reconhecimento dessas proteínas e o desenvolvimento de uma resposta autoimune.

Assim, são produzidas células (anticorpos) focadas no ataque desses componentes do próprio corpo. Temos, portanto, a detecção de elementos internos como patogênicos, instalando-se a autoimunidade.

Por mais que existam fatores genéticos que determinam uma maior susceptibilidade ao aparecimento de diabetes tipo 1, ainda não foi identificada nenhuma causa ambiental majoritária que motive o primeiro ataque às células beta.

A destruição dessas células pancreáticas normalmente tem início meses ou mesmo anos antes de os primeiros sintomas surgirem. Em grande parte dos casos, quando eles aparecem, mais de 90% das células beta do pâncreas do doente já foram destruídas.

Por outro lado, vale lembrar que as células que se encarregam dessa destruição — os anticorpos para as células beta do pâncreas —, podem ser detectados em estádios mais iniciais da doença, motivando uma intervenção terapêutica precoce.


Referência:
SOMPAYRAC, LAUREN; How The immune system works, Wiley-Blackwell, 2015